sexta-feira, 1 de maio de 2009

1º de Maio

Eh! Companheiro

Eh! Companheiro aqui estou
aqui estou pra te falar
Estas paredes me tolhem
os passos que quero dar
uma e feita de granito
não se pode rebentar
outra de vidro rachado
p'ras duas pernas cortar

Eh! Companheiro resposta
resposta te quero dar
Só tem medo desses muros
quem tem muros no pensar
todos sabemos do pássaro
cá dentro a qu'rer voar
se o pensamento for livre
todos vamos libertar

Eh! Companheiro eu falo
eu falo do coração
Já me acostumei à cor
desta negra solidão
já o preto que vai bem
já o branco ainda não
não sei quando vem o vento
pra me levar de avião

Eh! Companheiro respondo
respondo do coração
ser sozinho não é sina
nem de rato de porão
faz também soprar o vento
não esperes o tufão
põe sementes do teu peito
nos bolsos do teu irmão

Eh! Companheiro vou falar
vou falar do meu parecer
Vira o vento muda a sorte
toda a vida ouvi dizer
soprou muita ventania
não vi a sorte crescer
meu destino e sempre o mesmo
desde moço até morrer

Eh! Companheiro aqui estou
aqui estou p'ra responder
Sorte assim não cresce a toa
como urtiga por colher
cresce nas vinhas do povo
leva tempo a amadur'cer
quando mudar seu destino
está ao alcance de um viver

Eh! Companheiro aqui estou
aqui estou pra te falar
De toda a parte me chamam
não sei p'ra onde me virar
uns que trazem fechadura
com portas para espreitar
outros que em nome da paz
não me deixam nem olhar

Eh! Companheiro resposta
resposta te quero dar
Portas assim foram feitas
p'ra se abrir de par em par
não confundas duas coisas
cada paz em seu lugar
pela paz que nos recusam
muito temos de lutar.

Letra: Sérgio Godinho
Música: José Mário Branco

Margem de Certa Maneira, 1973

quinta-feira, 30 de abril de 2009

da Terra

«"um homem que fez o que ninguém tinha feito e que mais ninguém fez", graças a "um físico nascido da Terra"»
Alves Barbosa, Público online

E mais ninguém fará, digo eu. É da terra que nasce o esforço que a submete. Submeter este mundo, concordar com as descidas e combater as subidas, ignorar a tentação de parar, desmontar, não! Sempre mais e mais, até não haver mais: vingar a mortalidade provando que se chega a todo o lado só com o que a Terra nos dá.

Há 25 anos, morria Joaquim Agostinho.

domingo, 12 de abril de 2009

Certinho, certinho

Os que agora pedem a cabeça de Quique Sanchez Flores são os mesmos que rejubilaram com a miserável vitória na final da Taça da Liga.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Joyeux anniversaire, Monsieur Brel

À mon dernier repas
Je veux voir mes frères
Et mes chiens et mes chats
Et le bord de la mer
À mon dernier repas
Je veux voir mes voisins
Et puis quelques chinois
En guise des cousins
Et je veux qu'on y boive
En plus de vin de messe
De ce vin si joli
Qu'on buvait en Arbois
Je veux qu'on y dévore
Après quelques soutanes
Une poule faisanne
Venue du PérigordPuis je veux qu'on m'emmène
En haut de ma colline
Voir les arbres dormir
En refermant leurs bras
Et puis je veux encore
Lancer des pierres au ciel
En criant Dieu est mort
Une dernière fois

A mon dernier repas
Je veux voir mon âne
Mes poules et mes oies
Mes vaches et mes femmes
A mon dernier repas
Je veux voir ces drôlesses
Dont je fus maître et roi
Ou qui furent mes maîtresses
Quand j'aurai dans la panse
De quoi noyer la terre
Je briserai mon verre
Pour faire le silence
Et chanterai à tue-tête
A la mort qui s'avance
Les paillardes romances
Qui font peur aux nonnettes
Puis je veux qu'on m'emmène
En haut de ma colline
Voir le soir qui chemine
Lentement vers la plaine
Et là debout encore
J'insulterai les bourgeois
Sans crainte et sans remords
Une dernière fois

Après mon dernier repas
Je veux que l'on s'en aille
Qu'on finisse ripaille
Ailleurs que sous mon toit
Après mon dernier repas
Je veux que l'on m'installe
Assis seul comme un roi
Accueillant ses vestales
Dans ma pipe je brûlerai
Mes souvenirs d'enfance
Mes rêves inachevés

Mes restes d'espérance
Et je ne garderai
Pour habiller mon âme
Que l'idée d'un rosier
Et qu'un prénom de femme
Puis je regarderai
Le haut de ma colline
Qui danse qui se devine
Qui finit par sombrer
Et dans l'odeur des fleurs
Qui bientôt s'éteindra
Je sais que j'aurai peur
Une dernière fois.

Le dernier repas. Jacques Brel, 1964

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Atravessar o deserto

António Damásio vai ser entrevistado por Judite de Sousa.

Gostava mesmo

Não me lembro da última vez que li uma notícia de jornal sem aspas em notícia nem em jornal; desconfio que deve ter sido em castelhano.

Haverá futuro para este pseudo-jornalismo, transpirando agenda política (a falta de situacionismo também é agenda política)? Imagino alguém, daqui a 30 ou 40 anos, a tentar fazer trabalhos de investigação...

Que não há história no jornal das facadas (o epíteto não é meu, é do meu avô) não é novidade. A questão é que o espectro se estreitou de tal maneira que a distância que há uma década tinha que se percorrer entre o Diário de Notícias e o Jornal de Notícias chega hoje para ir do Expresso ao O Crime.

É divertidíssimo lembrar este último enquanto ele perde espaço. Não há muito tempo, era um jornal claramente distinto: as revelações da transsexual Lola sobre as preferências dos parlamentares da nossa república, o assassinato do tio pelo sobrinho, instigado pela sua mãe (que por acaso foi minha professora de Francês), por causa da posse do café, papelaria e dois apartamentos em frente ao liceu do Entroncamento (grande marco da minha adolescência, uma página inteira dedicada à terreola num jornal nacional, logo a seguir à coluna assinada pelo Miguel Ângelo, o arquitecto dos Delfins), toda a sorte de aberrações com animais domésticos... Era um mundo à parte.

Trabalhar n' O Crime nunca deve ter sido tão difícil.

D'abord

quarta-feira, 18 de março de 2009

Mais uma, menos uma

Estoira pólvora nas Olaias, mais uma vez, e a televisão não diz nada. É uma vergonha. Volta, Santana, estás perdoado.

domingo, 8 de março de 2009

Estertor de uma alma danada, 1

Nasci em Coimbra, não por acaso, mas por crença profunda da minha mãe na lendária competência dos médicos da cidade; cumprida a formalidade estava a caminho - e a minha mãe de regresso - a Penamacor, uma vila recôndita da Beira-Baixa. Numa das suas freguesias acabei por ser registado, e foi esta a primeira farsa da minha vida: preso burocraticamente a uma aldeia que não me diz rigorosamente nada e de onde toda a gente foge assim que tem meia oportunidade.
Pela Beira-Baixa a minha família foi ficando. Entretanto nasce a minha irmã, em Coimbra, claro. Já a viver em Castelo Branco, o primeiro sabor a urbanidade chegava através das longas e largas ruas, iluminadas por altos candeeiros que - consta - me faziam rir à gargalhada, mas principalmente por graça da assoalhada nas alturas de um nono andar onde, atrás de um sofá e afogado em bonecos, tive o meu primeiro quarto.
Como se de urbanidade já bastasse, a família concilia a compra de um Mercedes-Benz 200D de 1975 verde-claro com a mudança para o último subúrbio de Lisboa, a Norte: Entroncamento. Durante cinco anos vivi em casa dos meus avós. O meu avô acabado de se reformar do ofício de escriturário da CP e discreto conhecedor da vida nocturna, via crescer a barriga em tardes de tourada da TVE. A minha avó, presa desde tenra idade à cozinha e aos afazeres domésticos, com o pior ainda por vir pelas desgraças de uma tiróide demasiado ávida de cálcio que a havia de reduzir a uns meros metro e quarenta, primeiro, e de AVC, depois, mas este em corpo alheio e talvez pior por isso - a minha avó é senhora de não ser senhora de coisa nenhuma, a começar por ela própria; o pejo em incomodar os outros consigo vai ao limite de ter ultrapassado a esperança média de vida sem saber que era alérgica ao glúten. A minha avó, que não telefona porque não quer incomodar, sem em quase 30 anos me ter incomodado por um segundo que fosse.
Assim passei a minha infância, sem sair daquelas três ruas paralelas, universo que incluía a minha escola primária; universo com fronteiras, porém. Num deles, passavam comboios; no outro, muitos carros. Um dia iam passando os Lancia do rali de Portugal. Nunca passaram, e lá fiquei eu pendurado na cartolina (Forza Lancia). Ao fundo da rua, um jardim com uma aranha enorme pendurada na estufa fria debaixo do coreto; no topo, os bombeiros e a sua ruidosa sirene, os carros convertidos a partir dos Berliet do exército. As laranjas abundavam nas árvores do quintal de onde caíam limões, uvas e abóboras que se davam a escalada. A bicicleta satisfazia-se em subir e descer as três ruas, sempre com cuidado para não ser abalroado pelos mecânicos que a testar os travões um dia mataram o Snoopy. Não era preciso mais nada. E se fosse, havia cem metros mais à frente um supermercado.

sábado, 28 de fevereiro de 2009

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Solidariedade com Beppino Englaro

Por causa desta notícia, resolvi voltar a um post de há semanas, desta vez para transcrever o texto de Roberto Saviano na íntegra. É, está em castelhano; caso não tenham reparado, em Portugal não há periódicos de referência de esquerda.

Pidan perdón a Beppino Englaro
ROBERTO SAVIANO 11/02/2009

Como italiano, siento la necesidad de esperar que mi país pida perdón a Beppino Englaro. Perdón porque a los ojos del mundo ha demostrado ser un país cruel, incapaz de comprender el sufrimiento de un hombre y de una mujer enferma. Y que se ha puesto a gritar, y a acusar, animando a uno y otro bando. Pero no había bandos. No se trata de apostar por la vida o la muerte. No es así.

Beppino Englaro no era partidario de la muerte de su hija, y hasta su mirada muestra las huellas del dolor de un padre que ha perdido toda esperanza y felicidad, e incluso belleza, a través del sufrimiento de su hija. Beppino debía ser respetado como hombre y como ciudadano independientemente de lo que cada uno piense. También, y sobre todo, si no pensaba como Beppino. Porque ha sido un ciudadano que se ha dirigido a las instituciones, y porque luchando dentro de las instituciones y con las instituciones sólo ha pedido que se respetase la sentencia del Tribunal Supremo.

Sin duda, quienes no comparten la postura de Beppino (y la que Eluana había transmitido a su padre) tenían el derecho y el deber, impuesto por su propia conciencia, de manifestar su oposición a que se interrumpiesen la alimentación mediante sonda y la hidratación. Pero la batalla debía hacerse siguiendo la conciencia de cada uno, y no intentando intervenir poniendo trabas al Tribunal Supremo. Beppino ha preguntado a la ley y la ley le ha confirmado que tenía derecho. ¿Ha bastado esto para desencadenar la rabia y el odio contra él? ¿Es la caridad cristiana la que hace que le llamen asesino? Hace que un grupo de personas que no saben nada del dolor de una hija inmóvil en una cama le increpen como a un conde Ugolino que, igual que en el Infierno de Dante, devora a sus hijos por el hambre. Y dicen estas idioteces en nombre de un credo religioso.

Pero no es así. Yo conozco una iglesia que en mi pueblo es la única que se encuentra en territorios más complejos, junto a las situaciones más desesperadas, la única que ofrece dignidad de vida a los inmigrantes, a quienes son ignorados por las instituciones, a quienes no consiguen salir a flote en esta crisis. La única que proporciona alimento y que está presente entre aquellos que no encontrarían a nadie que les escuchara. Los padres combonianos, igual que la comunidad de San Egidio, el cardenal Sepe, y también el cardenal Martini, son órdenes, asociaciones y personalidades cristianas fundamentales para la supervivencia de la dignidad de mi país.

Conozco esta historia cristiana. No la de la acusación a un padre indefenso y solo y con la fuerza del derecho. Beppino, por respeto a su hija, ha difundido fotos de Eluana sonriente y bellísima, precisamente para recordarla en vida, pero podría mostrar el rostro hinchado y deformado de los últimos años que ha pasado tumbada en una cama, sin expresión y sin pelo. Pero no quería vencer con la fuerza del chantaje de la imagen, sino sólo con la fuerza del derecho que hace que una persona decida su propio destino. A quienes pretenden hacer méritos con la Iglesia fingiendo a menudo afecto hacia la pobre Eluana les pregunto: ¿dónde estaba la Iglesia cuando atronaba la guerra contra Irak? ¿Dónde están los políticos cuando la Iglesia pide humanidad y respeto para los inmigrantes apiñados entre Lampedusa y los abismos del Mediterráneo? ¿Dónde están estos políticos cuando la Iglesia, a menudo en ciertos territorios la única voz de resistencia, solicita una intervención decisiva en el sur y contra las mafias? Sería bonito poder pedir a los cristianos de mi país que no crean en quienes sólo se sienten con ánimos para especular sobre debates en los que no hay que demostrar nada con hechos, sino sólo tomar partido.

Lo que ha faltado estos días, como siempre, ha sido la capacidad de percibir el dolor. El dolor de un padre. El dolor de una familia. El dolor de una mujer inmóvil desde hace años y en una situación irreversible y que había expresado a su padre una voluntad. Y que personas que ni siquiera la conocían y que no conocen a Beppino ahora pongan en duda esa voluntad. Y que demuestran poco o ningún respeto al derecho. Incluso cuando se considera que no es posible compaginar este derecho con la moral de uno, y precisamente porque es un derecho se puede ejercer o no. Ésta es la maravilla de la democracia. Comprendo la voluntad de empujar a las personas a no disfrutar de este derecho. Pero no a negar el derecho en sí. El espectáculo que en España, igual que en Europa, ha dado Italia de un país que ha especulado por enésima vez. Muchos políticos han vuelto a utilizar el caso Englaro para tratar de crear consenso y distraer a la opinión pública, en un país al que la crisis ha puesto de rodillas, y en el que la crisis está permitiendo a los capitales criminales devorar a los bancos, donde los sueldos están congelados y no parece que haya solución.

Pero ésta es otra historia. Precisamente en un momento de crisis, de frases hechas, de poco respeto, Beppino Englaro ha dado fuerza y sentido a las instituciones italianas y a la posibilidad de que un ciudadano de nuestro país aún pueda tener esperanza en las leyes y en la justicia. Creo que esto debe ser evidente también para quienes no aceptan que se quiera suspender un estado vegetativo permanente y consideran que cualquier forma de vida, incluso la más inerte, debe ser tutelada. Quizá el error de Beppino haya sido la ingenuidad y la corrección de creer en las posibilidades de justicia en Italia. Y en cambio, debía emigrar, igual que emigran todos los que quieren una vida mejor y distinta. Desde Italia ya no se emigra sólo para encontrar trabajo, sino también para nacer y para morir. Y para obtener justicia.

Me he preguntado por qué Beppino Englaro, como, por otra parte, alguien le había sugerido, no consideró oportuno resolverlo todo a la italiana. En los hospitales muchos susurraban: "¿Por qué convertirlo en una batalla simbólica? Se la lleva a Holanda y asunto concluido". Otros aconsejaban el acostumbrado método silencioso, dos billetes de 100 euros a una enfermera experta y todo se habría resuelto enseguida y en silencio. Eutanasia clandestina.

Como en la película Las invasiones bárbaras [Denys Arcand], en la que un profesor canadiense con una enfermedad terminal y presa de horribles dolores se reúne con sus amigos y familiares en una casa junto a un lago y, gracias al apoyo económico de su hijo y de una enfermera competente, practica la eutanasia de forma clandestina.

Y quizá sólo en estas circunstancias consigues explicarte la historia de Sócrates y sólo ahora entiendes, después de haberla escuchado miles de veces, por qué bebió la cicuta en lugar de escapar. Todo esto se vuelve actual y resulta evidente que ese querer permanecer, esa vía de escape ignorada, y de hecho aborrecida, es mucho más que una campaña a favor de una muerte digna individual; es una batalla en defensa de la vida de todos.

Beppino Englaro, con su batalla, ha abierto un nuevo camino, ha demostrado que en Italia no existe nada más revolucionario que la certeza del derecho. Si en mi tierra fuera posible dirigirse a un tribunal para ver reconocido, en un plazo de tiempo adecuado, la base del propio derecho, no sentiríamos la necesidad de recurrir a otras soluciones.

Y a él le corresponde el mérito de habernos enseñado a allanar el camino de las instituciones, y a recurrir a la magistratura para ver afirmados los derechos de uno en un momento de profunda y tangible desconfianza. Y a pesar de todas las peripecias burocráticas, al final ha demostrado que en el derecho tiene que existir la posibilidad de encontrar una solución.

Por una vez en Italia la conciencia y el derecho no emigran. Por una vez no hay que salir fuera para obtener algo, o solamente para pedirlo. Por una vez no buscamos que nos escuchen en otro lugar; es imposible que un ciudadano italiano, independientemente de su forma de pensar, no considere a Beppino Englaro un hombre que está devolviendo a nuestro país esa dignidad que a menudo nosotros mismos le quitamos.

Imagino que Beppino Englaro, al mirar a su Eluana, sabía que el dolor que ha sentido su hija es el dolor de cualquier individuo que lucha por la afirmación de sus derechos. Ha hecho que se descubra de nuevo una de las maravillas olvidadas del principio democrático, la empatía, cuando el dolor de uno es el dolor de todos. Y así, el derecho de uno se convierte en el derecho de todos.

Estas palabras mías terminan dando las gracias a Englaro, porque si mañana en Italia cualquiera puede decidir si en caso de encontrarse en estado neurovegetativo quiere ser mantenido en vida por las máquinas durante décadas o elegir su final sin emigrar, como siempre, se lo deberemos a él. Es esta Italia del derecho y de la empatía la que permite respetar y comprender también elecciones distintas en las que sería hermoso reconocerse.

Traducción de News Clips. © 2009 by Roberto Saviano Publicado de acuerdo con Roberto Santachiara Literary Agency

aliás

Finalmente, a questão mais importante do nosso tempo: Joaquin Phoenix no show de David Letterman estava pedrado ou a gozar [está no Youtube]?

Ninguém me perguntou, mas eu acho que o homem está enojado. Compreensivelmente. Tudo isto tresanda a excremento, desde o diálogo do filme à atitude geral. O Mexia tresanda. O Ípsilon tresanda.

P.S. - Nota importante: o Pedro Vieira não tresanda. Eu sei que não, porque ele é um rapaz asseado. E tem talento.

"esquivo", diz o Mexia

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Quatro

Confesso que, coberto de ignorância sobre a obra de Mikio Naruse (1905-1969), foi com estranheza que registei a expressão que ilustra o cartaz do ciclo dedicado ao cineasta japonês na Cinemateca Portuguesa (Finalmente Naruse!, justamente o título do mesmo). Soou-me a Ípsilon. Sacudi o azedume (dirão uns que devia sacudir mais e com mais força, outros que devia ir sacudir-me da ponte 25 de Abril abaixo) e lá larguei os quatrocentos paus (gosto de falar em contos, dizia-me o Lebre, enquanto passeávamos sob as arcadas do Terreiro do Paço).
O meu fraco mas esforçado francês vai permitindo umas boas surpresas; hoje deixou-me com vontade de rever um filme cuja legendagem, há não muito tempo atrás, teria provocado a minha saída da sala, derrotado pela incompreensão e frustrado por ter ficado afastado da palavra do filme, belíssimo, rigorosíssimo, de uma sensibilidade que parece tão distante da vida contemporânea quanto o Japão rural está do tigre económico que a segunda metade do século passado revelou. A rever, imperiosamente, porque se trata de um tamanho banho de ética cinematográfica que me senti nu. Envergonhado. Escrevo sem conhecer os meandros que rodearam esta produção da Toho (apresentada como major japonesa pela folha de sala, da autoria de António Rodrigues) e tão pouco tive a honra de desfrutar qualquer outra obra de Naruse. Assim me fico, humildemente.
Mas lá está o cartaz, a exclamação do anúncio que soa, agora, a um envergonhado desabafo, humano na presunção e inopinado como outras discretas fraquezas. Quando se navega com as velas enfunadas pelos ventos dos dias que correm, parece que no melhor pano cai a nódoa.

Iwashigumo (Nuvens de Verão). Mikio Naruse, 1958

"just because"

Mr. Wolf
See that, young lady?
Respect.
Respect for one's elder shows character.

Raquel
I have character!

Mr. Wolf
'Cause you are a character,
doesn't mean that you have character.

Pulp Fiction. Quentin Tarantino, 1994

A caixa de comentários do Público.pt, um altar de cidadania

26.02.2009 - 12h01 - Omar, Lisboa

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Três

O Danny Boyle é que é o Darren Aronofsky.

Slumdog Millionaire. Danny Boyle, 2008.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Dois

Sinceramente, não me parece que Mickey Rourke ou Randy The Ram Robinson (ou Mickey The Ram Rourke, como escreve Emmanuel Burdeau nos Cahiers du Cinéma de Fevereiro) sabiam lidar com a situação em que se encontravam. Vinte anos depois de terem conhecido o auge - um "derrotando" no ringue um anti-americaníssimo ayatollah, o outro desnudando Kim Basinger retirando-lhe o recheio do frigorífico - estão hoje, perdão, estavam ontem com as vidas e carreiras em decomposição ilustrada pelas cicatrizes das operações cirúrgicas, de natureza bem distinta, num e noutro caso. Mas os dois desencantam um filme muito competente pela mão de um cineasta com quem tive seríssimos problemas - Requiem for a dream, sobrevalorizadíssimo amontoado de clichés - mas que soube explorar, ainda que sem laivos de génio (Roma não se fez num dia) uma história que podia muito bem ter resvalado para a lamechice ou, dado o historial do senhor director, para um festim de amputação de membros. O que Aronofsky tão desesperadamente quis dizer da América em Requiem... e não conseguiu, consegue agora, ainda que não seja claro que o tenha desejado.
Num mundo de violência que oscila entre a simulação (no ringue, com os fãs mais novos) e a concretização (no clube de strip, no supermercado), a cena mais violenta do filme, na minha opinião, passa-se numa inócua sessão de autógrafos. O que ali se passa e a reacção de Ram ao que o rodeia leva a imaginar um Rourke experimentando uma espécie de epifania daquilo que podia muito bem ter sido o seu futuro como actor caído em desgraça e pugilista demasiado velho para ser levado a sério pelos seus pares.
Há que assumir, contudo, que seja presunçoso supor que se conhece a vida de Mickey Rourke pelos media; ao fim ao cabo, ele pode até ter gostado que lhe partissem a cara - e o homem até deve ter dado mais do que levou, visto o seu record. Com este paleio todo, quem acaba a ter epifanias sou eu: enquanto escrevia isto lembrava-me do diálogo entre Marsellus Wallace (Ving Rhames) e Butch Coolidge (Bruce Willis) em Pulp Fiction.

Marsellus Wallace
(...)
Thing is Butch, right now you got ability.
But painful as it may be, ability don't last.
And your days are just about over.
Now that's a hard motherfuckin' fact of life, but it's a fact of life your
ass is gonna have to get realistic about.
This business is filled to the brim with unrealistic motherfuckers;
motherfuckers who thought their ass aged like wine.
If you mean it turns to vinegar, it does. If you mean it gets better with age, it don't.
Besides, Butch, how many fights you think you got in you anyway?
Two?
Boxeurs don't have an old timer's day.
You came close, but you never made it.
And if you were gonna make it, you would have made it before that.


E não é que Rourke recusou o papel entregue a Bruce Willis? Vá-se lá saber porquê. Mas na volta é tudo treta, e isto não passa de paleio barato à moda da Wikipédia e das trivialidades do IMDB. A verdade é que esperava tudo menos acabar a escrever sobre epifanias depois de um filme de Darren Aronofsky. Só me ocorre um responsável. Como Sean Penn disse no Domingo passado:

I'm very, very proud to live in (...) a country who for all its toughness creates (...) courageous artists who despite a sensitivity that sometimes has brought enourmous challenge, Mickey Rourke rises again, and he is my brother.

The Wrestler. Darren Aronofsky, 2008.

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Boas práticas da imprensa portuguesa

Quando a PJ identificou o indivíduo, detectou que já estava referenciado noutra situação com contornos semelhantes. Já tinha tentado ter relações sexuais com outro rapaz, de 12 anos, com quem trocou mensagens pornográficas e de teor homossexual.

Relata o jornalista do JN que um rapaz de 23 anos, acusado de violação por um jovem de 14, já havia tentado ter relações sexuais com um outro rapaz de 12 anos, trocando com ele "mensagens pornográficas" (via SMS?), das quais se denota o "teor homossexual".

Quando a PJ identificou o indivíduo, detectou que já estava referenciado noutra situação com contornos semelhantes. Já tinha tentado ter relações sexuais com outro rapaz, de 12 anos, com quem trocou mensagens pornográficas e de teor heterossexual.

Need I say more?

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

mandem-lhe condolências para o facebook

"Depois da virgindade, a morte". Ou "depois disto, que virgindade?" - que, no sentido mais amplo da palavra, é estado que esta senhora nunca deve ter conhecido.

Órfãos de mãe, arrecadado o bago (especulemos), estarão os filhos conscientes do que lhes facultou o dinheiro? Uma espécie de indemnização paradoxal por não crescerem na companhia da mãe, com quem provavelmente a venderiam cada momento das suas vidas em hasta pública... A intimidade impossível é finalmente uma realidade que, como tal, não se discerne onde começa e onde acaba.

homo sacer

os que, apesar de humanos, estavam excluídos da comunidade humana e podiam ser mortos impunemente - é precisamente por essa razão que não podiam ser sacrificados (pois não representavam nada de sacrificável)
Slavoj Žižek, Bem-vindos ao deserto do real, Relógio de Água

Quando já não houver quem queira ser clandestino neste ocidente de legais atropelos, enche-me de curiosidade imaginar quem tomará o lugar da indigência.

"Bairro Alto", 23.30 de Terça-Feira, RTP2

O cinema não é para a posteridade (...)

Se a afirmação de António Pedro Vasconcelos já é estúpida por si só, mais se torna quando escutada após chegar de um visionamento de um filme do António Campos.
Mas o prolífico cineasta não deixa os créditos por mãos alheias.

Fui para Paris para ver os clássicos, para ver de onde vinha o cinema (...)

Está mesmo a pedi-las. Uma daquelas do João César, claro. Caso não saibam, o bom do Vasconcelos foi Secretário Nacional do Audiovisual, nos tempos em que Cavaco era menos dado a intervenções promotoras da "sã convivência constitucional", pelo menos daquelas que não envolviam canhões de água, cassetetes e fardas azuis.

O filme do Vasconcelos já não vejo. Verei o Vasconcelos com muito prazer quando ele se apresentar como cineasta. Quando se apresentar como secretário do Audiovisual, (...) acho que não tenho interesse nenhum em ver, porque o cinema pode ser divertido mas não é nenhuma brincadeira.
(...)
O audiovisual é aquela coisa que ninguém sabe o que é, nem o próprio secretário. O secretário sabe uma coisa: é que, para que aquilo funcione (sem ter de ir buscar dinheiro do IPC), precisa de uma subvenção da ordem dos quatro milhões de contos, o que é bom para ele. Mas suponho que o Cavaco não tem essa massa. Gostaria de ter, mas não tem, nem vai ter, porque vamos todos, agora, ter de apertar um bocadinho o cinto. Como andámos, durante os últimos anos, a viver à custa dos fundos comunitários, agora é assim. Porque neste país não se cria riqueza, parasitam-se os fundos comunitários. Agora vou-me rir, mas há seguramente muita gente que não se vai rir: os mesmos, os do costume, quando tiverem que apertar o cintinho. Porque, como é evidente, isto vai recair sobre a maralha - a população portuguesa. E sempre mais sobre uns do que sobre outros. A história é conhecida. Ora o Vasconcelos - pessoa que, aliás, eu muito estimo - tem um sonho na vida: ganhar muito dinheiro. Género: "como é que a gente vai engenhocar uma coisa para eu me vestir de alto a baixo nos Versace, nos Pollini, nos Armani?" Isto é: "Como é que eu vou comprar as minhas brutas fatiotas e vestir-me como nenhum italiano se veste, a peso de ouro? Como é que eu vou andar com roupinhas na ordem dos milhares de contos e não só roupinhas...?" Então, ele teve a ideia do Audiovisual. Mas como o Cavaco gostava de dar, mas não vai poder dar-lhe a massa, a pergunta que eu faço é esta: «O Vasconcelos não ganharia mais como pessoa honesta? Com um bocadinho de trabalho, não seria mais rentável?»
Entrevista a José Manuel Rodrigues da Silva, in Jornal de Letras, 22 de Setembro de 1992.

Era para truncar esta última resposta, mas baqueei quando me dei conta que isto foi dito e escrito há dezassete anos. Como é que ninguém meteu os pés à parede, entretanto, é coisa que não consigo entender, ou por outra, tenho medo de perceber. Porque no dia em que as chagas das feridas que a corja dos Dias Loureiro, Oliveira e Costa e afins abriram para chupar o sangue deste país começarem a gangrenar e a obrigar à consequente amputação dos falidos membros desta tragicomédia, vai escorrer sangue pelas vielas de S. Bento.

Não contem é comigo para carpideira.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Deve ser por isto

(foto roubada d'as aranhas)

ao ser de novo questionado sobre esta decisão de não querer publicar mais, acaba por explicar o seu caso comparando-se com Ronnie Peterson, o piloto sueco de Fórmula 1, quando disse ao comendador Ferrari: "Você é mau homem de negócios, comprou-me um bilhete de ida e volta"


António Lobo Antunes, in DN 16/02/2009

Ronnie Peterson (esparramado em 2º plano, garbosamente apoiado no cotovelo) morreu depois de um acidente na primeira volta do Grande Prémio de Itália, em Monza, a 11 de Setembro de 1978. Antes que alguém se assuste com a data, lembrem-se que é um dia tão mau para morrer como qualquer outro dos 364 disponíveis (mais o ocasional 29 de Fevereiro). Porém, para correr em Monza, il commendatore, caso tivesse Peterson na sua equipa, não tinha que lhe comprar bilhete... Isto se o superswede tivesse corrido para a Ferrari, coisa que nunca aconteceu.

Não que isso importe por aí além. Mais a mais, dos constantes da foto já não sobram muitos, e não por causa da tosse, a saber: Carlos Pace (com a Ordem e Progresso no fato) morreu num acidente de avião em 1977; Denny Hulme (sentado à esquerda) morreu de ataque cardícaco a 270 km/h, num BMW M3, nas Bathurst 1000 de 1992; o seu colega de equipa, Peter Revson (imediatamente atrás na foto, de pé e também com as riscas da Gulf) morreu no mesmo asfalto - Kyalami, África do Sul - desta foto, em 1974; François Cevért (atrás das patilhas de Stewart e Fittipaldi, lá ao fundo de óculos de sol) morreu nesse ano, na corrida de Watkins Glen, nos EUA; Clay Regazzoni (2º de pé a contar da direita), que ficou paraplégico num acidente em competição, veio a morrer num acidente de viação em Dezembro de 2006.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Nós votamos em si*

*Slogan do programa da SIC Nós por Cá

A espécie de dimensão social histórica que restaria ainda ao esquecimento sob a forma de culpabilidade, de latência vergonhosa, de não dito, já nem mesmo existe, pois que a partir de agora “toda a gente sabe”, toda a gente vibrou e choramigou perante a exterminação – indício certo de que “isso” nunca mais ocorrerá.
(...)
E querem-nos fazer crer que a televisão levantará a hipoteca de Auschwitz fazendo irradiar uma tomada de consciência colectiva, quando ela é a perpetuação sob outras espécies, sob os auspícios, desta vez já não de um lugar de aniquilamento mas de um medium de dissuasão.

Jean Baudrillard, Simulacros e Simulação